Comer insetos durante as refeições pode parecer estranho, mas é costume em muitos países.
Na Universidade Federal de Viçosa (UFV), pesquisadoras têm estudado grilos pretos e outros insetos para a produção de uma farinha comestível como uma alternativa para o consumo de proteínas e para a falta de suprimento nutricional diante de problemas previsíveis, como epidemias, mudanças climáticas e degradação ambiental.
No Brasil, a legislação ainda não permite o consumo desses produtos como acontece em outros lugares do mundo, mas o acesso é permitido para pesquisas.
Os estudos, conduzidos pela professora Ceres Mattos Della Lucia, envolveram experimentos com grilo preto (Gryllus assimilis) e com larva-da-farinha (Tenebrio molitor), e avaliação da composição nutricional da barata d'água (Belostoma anurum).
Durante os trabalhos, foi realizada a caracterização completa dessas farinhas, sendo avaliada a qualidade das proteínas, os micronutrientes contidos nos produtos, a segurança do uso e como o ferro é absorvido pelo organismo.
“O tema é novo, mas tem grande potencial para o futuro. Por isso, nós queremos ter respostas para auxiliar escolhas alimentares alternativas como estas, caso sejam aprovadas no Brasil”, explicou.
As pesquisadoras também avaliaram a digestão desse tipo de proteína e o potencial das propriedades para a indústria de alimentos na fabricação de produtos.
Segundo a professora Ceres Mattos, as farinhas de insetos foram pensadas para serem usadas como ingredientes que podem agregar valor nutricional e substituir outras para alérgicos e celíacos, por exemplo.
Os estudos experimentais foram realizados com ratos de laboratório, o primeiro passo até chegar aos testes com humanos.
Para avaliar os alimentos, alguns camundongos receberam ração sem nenhuma fonte proteica — o chamado grupo controle.
Um segundo grupo recebeu a caseína, uma proteína do leite, chamada de padrão-ouro para esse tipo de estudo.
Outros foram alimentados com farinhas de grilo com ou sem adição de farinha de soja, o que poderia tornar essas proteínas mais completas.
Ao avaliar os roedores, as pesquisadoras concluíram que o grupo que recebeu apenas farinha de grilo apresentou crescimento semelhante ao que foi alimentado com proteína animal. Além disso, foram os que mais consumiram a ração, mostrando a boa aceitação do produto.
Os índices de qualidade proteica demonstraram que a farinha de grilo apresenta boa digestibilidade e a qualidade da proteína oferecida não se alterou quando a mesma foi misturada a leguminosas, como a soja.
Outra boa notícia é que não foi observado nenhum sinal de toxicidade nos animais.
Atualmente, pesquisas do mesmo grupo avaliam a biodisponibilidade de ferro nessas farinhas e os efeitos em órgãos, como intestino e fígado.
Em uma próxima etapa, as pesquisadoras irão avaliar a segurança do uso das farinhas a longo prazo e depois, se houver interesse, chegar à etapa de testes com humanos.
“Queremos desmistificar o consumo de insetos, divulgar seu potencial e fornecer dados que servirão de base para possíveis regulamentações de seu uso no Brasil”, concluiu a professora Ceres.
Fazem parte ainda da equipe a doutoranda Lívya Alves Oliveira, as mestrandas Laura Célia Oliveira de Souza Vicente e Michele Lilian da Fonseca Barnabe e bolsista de iniciação científica Karina Vitoria Cipriana Martins.
Fonte: G-1 Zona da Mata