A lei municipal 13.071, que institui a Política Municipal de Utilização Sustentável dos Veículos de Tração Animal (VTA) em Juiz de Fora, e sua regulamentação foram tema de audiência pública realizada nesta terça-feira (11) na Câmara Municipal. Diante de expressivo público e com debates acalorados, representantes do secretariado, parlamentares e sociedade civil formularam seus questionamentos a respeito da implementação da norma, que, após cinco anos de sua publicação, entrou em vigor em 20 de dezembro de 2019. O requerimento para a audiência foi de autoria do vereador Vagner de Oliveira (PSC).
“Acredito que essa lei precisa de maior visibilidade, de ter mais debate, e acredito que é o que todos querem. Falta entendimento sobre o que é que determina de fato essa norma. O que nós queremos discutir e o que nos preocupa é saber o que pode e o que não pode, como ela será aplicada, por exemplo, nos distritos de Juiz de Fora. Isso também preocupa as comunidades”, apresentou o proponente. De acordo o texto da legislação, aqueles que forem flagrados desrespeitando a proibição da circulação de carroças nas vias públicas da cidade ficarão sujeitos a multa de R$ 500. Em casos de reincidência, a sanção pecuniária será aplicada com o valor dobrado, e o Município ficará responsável por apreender o VTA e sua carga, além de remover o animal ao depósito público.
O que tem sido motivo de debate, no entanto, é o uso das carroças em bairros e para fins de lazer, além da argumentação, por parte do carroceiros, de que a maior parte dos trabalhadores estaria cuidando de forma adequada de seus animais. Na audiência, muitos trabalhadores da categoria e representantes da Associação Cultural dos Condutores de Veículos de Tração Animal de Juiz de Fora (Acovetra) ponderaram que a lei generaliza o uso de carroças e os maus tratos animais. Na argumentação da categoria, a minoria dos carroceiros causa algum tipo de mal aos equinos. “A gente está de acordo com eles (defensores da causa animal) em fiscalizar os maus tratos contra os animais. Mas, por outro lado, a maioria está pagando por alguns”, alegou o presidente da Acovetra, Marçal de Paula Soares Menezes.
Também membro da Acovetra, Valdemar Macedo Barbosa afirmou que a associação não é a favor dos maus tratos de animais e que a lei deve sim punir aqueles que a infringem. No entanto, ele também defende que a categoria não deve pagar pelo que não acontece de forma generalizada. “O que falta é fiscalização. Tem que ser igual motorista, aquele que não está dentro da lei é punido, e não ter uma proibição.”
Maus-tratos
Em contrapartida, militantes e membros de associações de defesa da causa animal expuseram que muitos equinos são abandonados por carroceiros às margens do Rio Paraibuna e que os animais estariam expostos ao sol, alguns sem água e alimentação adequados. A veterinária Neiza Teixeira Lourenço milita há 20 anos pela causa animal e trabalhou por três anos no Canil Municipal. De acordo com ela, decreto datado de 1934 já previa respaldo de atendimento médico-veterinário, mas afirmou que os animais não recebem esse atendimento como previsto em lei.
Outro participante da sessão, Rodolfo de Moura Marques também pontuou que a lei nº 9.605, de 1998, já estabelecia que o cuidado com os animais é uma obrigação dos carroceiros. O participante também levantou questões a respeito da circulação dos animais em via pública: “Quem vai arcar com a sujeira feita pelos cavalos nas ruas? (…) Como que nós cidadãos podemos denunciar a circulação de carroças ou quem maltrata?” Na visão dele, é preciso que a lei seja mais clara com relação às denúncias e à fiscalização.
Também presente na audiência, o professor do departamento de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Adolfo Firmino da Silva, ponderou que o bem-estar animal precisa ser colocado como parte de um todo da saúde pública. “Se cuida da saúde do animal para cuidar da saúde do homem. Existe essa preocupação em locais urbanos”. Na visão do professor, a lei foi tolerante em relação aos cuidados com os animais. “Por exemplo, fazer um exame anual não está dentro da realidade. Temos doenças como a Febre do Nilo, que tem tido ocorrência próximo a nós, e o exame tem que ser exigido com maior frequência. Às vezes, a pessoa fala que toma os cuidados médicos necessários, mas só medica o animal por conta própria sem consultar um profissional. A lei tem que ter uma garantia maior com a saúde animal”, disse.
Prefeitura afirma que categoria não aderiu a capacitação
Uma das alegações apontadas pela Acovetra é de que, nos últimos cinco anos, o Município não tirou do papel a previsão estabelecida pelo Capítulo IV da legislação municipal que afirma que “o Poder Executivo poderá disponibilizar meios de capacitação profissional para o trabalhador em VTA, com o objetivo de inseri-los no mercado de trabalho”.
Subsecretário de Assuntos Ambientais e Urbanos da Secretaria de Meio Ambiente e Ordenamento Urbano (Semaur), Aldair Elpes afirmou que em relação à capacitação não houve adesão do segmento, mas que o Executivo irá adotar as medidas previstas pela lei e que a Administração Municipal não pode ser negligente com o cumprimento da norma. No entanto, conforme o subsecretário, a Prefeitura está aberta ao diálogo. “Se esta Casa chegar à conclusão de que deve ter alteração na lei, cabe ao Executivo acatar. Estamos abertos a ouvir esse segmento da sociedade e fazer aquilo que precisa, no sentido de compatibilizar a proteção animal, mas tendo cuidado para que essas pessoas (carroceiros) não sejam abandonadas.”
A lei foi proposta pelo então vereador e hoje deputado estadual Noraldino Júnior (PSC), em 2014. Na reunião desta terça, Noraldino foi representado pela veterinária Flávia Quadros. De acordo com ela, o deputado se dispôs a viabilizar emenda parlamentar, caso seja da vontade do Executivo, para que se beneficie os carroceiros que se veem “na necessidade de readaptar-se sem ter que imediatamente mudar de atividade”. A proposta, no entanto, foi recebida por vaias por parte do segmento de carroceiros.
Fonte: Tribuna de Minas