Saiba porque crianças não devem fazer musculação e quais impactos esse exercício causa aos pequenos
DIVERSOS
Publicado em 10/09/2022

 

A musculação é um exercício físico praticado por diversos brasileiros, que dedicam horas do dia ao treino. Apesar de ser comum entre os adultos, a musculação não é uma prática recomendada às crianças e não traz benefícios para esta faixa etária.

Recentemente, Gracyanne Barbosa compartilhou em suas redes sociais a neta Alice, de cinco anos, praticando exercícios em uma barra. Mesmo com o teor de brincadeira, os vídeos acendem um alerta para os casos em que a prática se torna preocupante.

 

Em meados de julho, um jovem de 14 anos foi apelidado de “Pequeno Hulk” por ter 1,85m e pesar 133 kg. Em suas redes sociais, Tyler Parker dizia ser capaz de levantar até 188 kg. O presidente do Departamento Científico de Ortopedia da SPSP, Miguel Akkari, explica como a musculação nessa idade pode ser perigosa.

“Temos que tomar muito cuidado, porque na fase de 14 anos eles querem ganhar massa muscular muito rápido, e esse ganho não vai aparecer, porque para você ter massa muscular visível, precisa ter uma virada hormonal. E, às vezes, isso pode causar frustração, pode fazer com que ele queira aumentar as cargas e o treino pode gerar lesões”, esclarece Akkari.

A virada hormonal, segundo o especialista, para a mulher, se dá após a menarca – primeira menstruação. Em geral, dois anos depois de mentruar ela está fechando as cartilagens de crescimento – permitem que os ossos se alonguem até que a criança atinja sua altura final, quando as placas de crescimento são substituídas por osso –, e a estrutura esquelética já se assemelha com a que ela terá na fase adulta.

Já o homem, em média, obtém esta virada em torno dos 16 anos, às vezes aos 15, mas raramente aos 14 anos. Portanto, um exercício como a musculação, que visa o aumento do tamanho e volume dos músculos, não é tão aconselhado para pessoas abaixo desta idade.

“Não é recomendado em criança o exercício repetitivo, o mesmo tipo de exercício para você querer hipertrofiar, porque para tentar a hipertrofia muscular eu tenho que fazer sistematicamente aquele movimento repetitivo, ou aumentar a carga progressivamente, só que isso [hipertrofia] não vai acontecer, porque a criança não tem hormônio", explica Akkari.

E acrescenta: “se ela começar a pegar pesado na musculação e tiver as cartilagens de crescimento abertas, porque cada osso tem cartilagens de crescimento, dependendo da intensidade de treino que ela faz, pode ter lesão muscular, lesão tendinosa e até lesão óssea.”

A pediatra especializada em emergência pediátrica da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo, Lívia Aguiar diz que, mesmo diante disto, há certos casos de crianças que conseguem atingir um nível de hipertrofia.

“Existem na história crianças que acabaram tendo restrições alimentares e excessos de exercícios que conseguiram deixar a musculatura mais rígida, mas isso não é o ideal para a criança", informa Lívia.

Vale ressaltar que lesionar uma cartilagem de crescimento pode acarretar diversos malefícios para o pequeno.

“Interfere no crescimento em estatura e pode gerar lesões via articulação – no exercício físico em excesso e sem nenhum tipo de auxílio. [Lesões nas articulações] podem fazer rupturas de ligamento, dependendo do exercício, se for de maneira incorreta, pode gerar edema e acúmulo de líquido", descreve a pediatra.

Um dos pontos que também são preocupantes neste quesito é a intensidade do treino a que a criança se submete. Para Miguel, "o que nós vemos é que, às vezes, as crianças têm fôlego e a estrutura esquelética não aguenta". Por conta disso, na maior parte dos casos, o indivíduo só percebe que passou do limite quando a criança já está lesionada.

É fundamental que, nos casos em que a criança opta pela prática da musculação, ela seja guiada por um pediatra ou um profissional do esporte infantil.

“O quanto a criança está preparada para fazer, o quanto ela pode praticar de exercícios sem gerar nenhum tipo de dano, sempre tem que ter uma avaliação, não pode ser uma coisa acompanhada pelos pais”, alerta a Lívia.

Além disso, no quesito de desenvolvimento, a musculação é indiferente para este público.

“Não vai incentivar entrosamento com os colegas, a parte social é muito ruim nesse tipo de exercício. Não vai desenvolver equilíbrio, porque a musculação não desenvolve equilíbrio, não desenvolve coordenação. Então, qual a vantagem da musculação como você conhece para uma criança? Não tem muita”, alerta Akkari.

Isto não significa que a prática correta do exercício não acarreta nenhum tipo de benefício à criança, segundo Lívia, quando acompanhada e bem orientada pode "colaborar com o sistema imunológico, ajudar no controle da pressão arterial e do colesterol e na autoestima da criança – desenvolve resiliência."

Em que casos a criança pode fazer?

Para o Akkari, vale ter o discernimento da capacidade física da criança, mas também da psicológica, pois ela pode dar continuidade aos treinos apenas para não decepcionar outras pessoas, como o pai ou o treinador.

Caso isso não ocorra, a prática pode ser feita para atingir determinados objetivos.

“A musculação como é conhecida por nós, não tem benefício nenhum [para a criança]. A não ser para tentar fazer um pouco de fortalecimento, mas você pode fortalecer com outras atividades”, informa Akkari.

Miguel também menciona a possibilidade da musculação para equilíbrio muscular e cita o exemplo de uma criança que treina tênis por três horas ao dia.

“O tênis é um esporte unilateral, ele trabalha grupos musculares específicos, trabalha pouco a musculatura dorsal e não trabalha nada a contralateral, porque você só joga de um lado, não usa as duas mãos. Nesse caso, você pode usar a musculação para fazer um equilíbrio muscular, para trabalhar o músculo que ela ‘não usa’. Mas, é uma musculação orientada, visando determinado resultado”, exemplifica o ortopedista.

Para Lívia, crianças de zero a cinco anos devem focar nos exercícios mais lúdicos e que não exijam tanta coordenação motora. Acima disso, com seis e dez anos, há possibilidade de praticar capoeira ou dança, por exemplo. 

Para os maiores, de 10 a 12 anos, que já estão mais velozes e com as habilidades mais desenvolvidas, práticas como o futebol e o ciclismo podem ser positivas. As crianças que estão entrando na puberdade já possuem mais resistência física, então podem cogitar exercícios com força, pois a chance de sobrecarga é menor. 

"Se houver necessidade, para recuperação de músculo ou após algum tipo de procedimento cirúrgico, algum tipo de trauma, também podemos fazer musculação supervisionada e com controle de peso e quantidade de exercício", conclui a pediatra.

*Estagiária do R7 sob supervisão de Carla Canteras.

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