O alerta do MG Transplantes chama a atenção para a necessidade dos hospitais aumentarem a notificação de potenciais doadores, além de se ampliar o debate sobre o tema, já que ainda há resistência das famílias em autorizar a doação.
Segundo a Fundação Hospitalar do Estado (Fhemig), há dez anos, Minas vivia o marco de fila zero para o transplante de córnea - cenário em que a captação de tecido ocular era capaz de suprir toda a demanda existente em poucos meses.
A partir de 2015, a espera voltou a crescer: na época, 371 pessoas aguardavam por uma córnea. Com a pandemia, vieram mudanças nos protocolos sanitários, que contribuíram para reforçar a segurança dos transplantes frente à situação de emergência de saúde pública.
Mas também aumentaram ainda mais a fila. De 2019 a 2021, o número de pessoas aguardando por uma córnea quase dobrou, passando de 1.270 para 2.473.
O médico oftalmologista e coordenador do Núcleo de Tecidos Oculares do MG Transplantes, Paulo Lener Peixoto de Araújo Filho, explica que uma das restrições adotadas na pandemia foi a interrupção temporária da captação de doadores de coração parado.
Ao contrário dos doadores de morte encefálica – que podem doar múltiplos órgãos e tecidos – os doadores de coração parado representam a principal fonte de córneas para transplante.
“O número de óbitos de coração parado é muito maior do que os de morte encefálica. Além disso, há um prazo de seis horas após a parada cardíaca para a enucleação (retirada do globo ocular). Antes da pandemia, cerca de 80% das doações de córneas vinham de doadores de coração parado. Hoje, há uma inversão dessa situação. A maioria vem da morte encefálica, o que acarreta uma redução no número de córneas disponíveis e, consequentemente, em um tempo maior de espera para os pacientes”, disse o coordenador.
O MG Transplantes informou que tem trabalhado para fortalecer as comissões intra-hospitalares para doação de órgãos e tecidos para transplantes – as CIHDOTTs – que são responsáveis pela identificação de potenciais doadores nos grandes hospitais de Belo Horizonte e do interior.
“Estamos revisitando essas comissões para auxiliá-las em sua reorganização, já que muitos dos profissionais que nelas atuavam foram deslocados para outras funções durante a pandemia. Por isso, estamos promovendo novos treinamentos para essas equipes”, afirma Lener.
“Atualmente, a maioria das CIHDOTTs comunica o óbito aos bancos de olhos e, após avaliação do doador, exclusão das contraindicações para doação e o consentimento familiar, a equipe se desloca para fazer a captação de tecidos oculares. A nossa ideia é ampliar nos hospitais as equipes que façam não só a avaliação e a entrevista familiar, como também a retirada do globo ocular. Dessa forma, simplificamos o processo e ganhamos tempo”.
O coordenador falou de outras ações. Segundo o médico, a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) tem oferecido incentivo financeiro para hospitais que cumprirem uma meta mínima de captação.
"Além disso, temos reforçado as campanhas de conscientização. Só vamos conseguir reduzir a fila com envolvimento de toda a sociedade. Sabemos que não é um momento fácil para a família, mas pode ser que a pessoa sempre tenha tido vontade de ser um doador”.
Atualmente, há três bancos de tecidos oculares em Minas. Dois deles pertencentes à Fhemig: o banco do Hospital João XXIII, em Belo Horizonte, e do Hospital Regional João Penido, em Juiz de Fora.
O Banco de Tecidos Oculares do João XXIII é o principal do estado. Ele é responsável pela regional metropolitana e fornece grande parte das córneas para transplantes em Minas Gerais. O serviço também promove capacitação das CIHDOTTs, além de credenciamento e treinamento de novas equipes externas de captação.
* Com informações da Agência Minas e Jornal Hoje em Dia