A Inconfidência Mineira foi o movimento de rebeldia mais importante do Brasil. A afirmação não é minha, mas de Boris Fausto, historiador e membro da Academia Brasileira de Ciências, em sua obra História Concisa do Brasil (2012). O movimento foi eternizado em 21 de abril como Dia de Tiradentes. Porém, mais do que um feriado prolongado, esse é um momento de reflexão sobre a conquista da democracia, hoje estabelecida em nosso país.
Para isso, vale lembrar um pouco de sua história. A Inconfidência iniciou-se em 1750, quando a produção de ouro na sociedade mineira entrou em declínio. Mesmo com a situação econômica desfavorável, a Coroa portuguesa continuou cobrando impostos, o que desencadeou inquietações sociais e políticas.
Aqueles que resistiam aos ideais portugueses passaram a ser conhecidos como inconfidentes. O grupo era formado por membros da elite colonial – mineradores, fazendeiros, padres, funcionários, advogados de prestígio e uma alta patente militar. Entre eles estava José Joaquim da Silva Xavier, uma exceção entre os inconfidentes, pois ficou órfão e não recebeu heranças de seus pais.
Ele e seus irmãos tentaram trabalhar, sem sucesso, com comércio. Em 1775, José Joaquim entrou para a carreira militar, no posto de alferes, correspondente ao grau inicial do quadro de oficiais. Nas horas vagas exercia o ofício de dentista, de onde surgiu o apelido um tanto depreciativo: Tiradentes.
A partir de 1782, com a mudança política em Minas Gerais, José Joaquim perdeu o comando do destacamento militar que patrulhava a estratégica estrada da Serra da Mantiqueira, porta de entrada para as minas. Em meio à tentativa de impedir a cobrança de impostos atrasados por parte da Coroa portuguesa, chamada de Derrama, os inconfidentes começaram a se preparar para o movimento de rebeldia nos últimos meses de 1788.
Porém, em março de 1789, o visconde Barbacena suspendeu a Derrama e os conspiradores passaram a ser denunciados e presos. Tiradentes recebeu uma punição diferente. Enquanto os outros eram expulsos do país, após apelos de clemência, ele foi enforcado na presença da tropa e da população, em meio a discursos de aclamação à rainha de Portugal. Em seguida, seu corpo foi desmembrado e sua cabeça foi exibida na praça principal da cidade de Ouro Preto.
Sua figura foi esquecida pela monarquia como traidor da pátria portuguesa. Apenas com o início da república brasileira, em 1889, com os marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, Tiradentes foi elevado à condição de herói brasileiro e figura hoje como patrono das polícias militares do Brasil.
Ao defender juntamente com os demais inconfidentes os ideais republicanos, inspirados no modelo constitucional dos Estados Unidos, cumpriu de forma exemplar a pena dada aos traidores dos ideais da monarquia portuguesa. Ao assumir a culpa pelos supostos crimes cometidos, Tiradentes propicia um exemplo de luta pelos ideais dos mais nobres, como é caso da defesa de uma república constitucional perante uma monarquia absolutista.
Enfatiza-se ainda a questão de que o alferes, advindo de família sem muitas posses, não possuía à época de seu julgamento quem olvidasse sua clemência junto à Coroa portuguesa. Como militar e preso a juramentos de fidelidade perante a Coroa portuguesa, a sentença de traição lhe foi atribuída de forma raciocinada.
Assim, esse episódio histórico do Brasil, longe de ser visto apenas como mais um feriado prolongado, há de ser um momento de reflexão sobre a importância da conquista da democracia, hoje consolidada em nosso país. E esse feito se deu graças a heróis como Tiradentes que, segundo Boris Fausto, é “cultuado como mártir não só pela direita e pela esquerda, como pelo povo da rua”.
* Gerson é Historiador, Pedagogo e Professor de Direitos Humanos e Cidadania no Centro Universitário Internacional Uninter.
Assessoria de imprensa da Uninter > Giulia El Halabi/ Jornal Leopoldinense