Brasil supera 180 mil mortos por Covid-19, pior cenário projetado no Ministério da Saúde
DIVERSOS
Publicado em 12/12/2020

 

RIO e SÃO PAULO - O Brasil atingiu hoje a marca de 180 mil mortes por Covid-19, uma cifra que, até abril, era vista como o pior cenário possível da epidemia para o país. Quando ainda comandava o Ministério da Saúde, a equipe do médico Luiz Henrique Mandetta trabalhava com três projeções, incluindo uma mais otimista, de 30 mil mortos até a chegada da vacina, e uma considerada factível, de 80 mil. A mais sombria de todas é aquela que foi superada agora, com o número de óbitos em 180.453.

 

Essa marca foi registrada nesta noite a partir dos números compilados pelo consórcio de veículos de imprensa compostos por O GLOBO, G1, O Estado de São Paulo, Folha de S.Paulo e UOL, que compila diariamente números reportados pelas secretarias estaduais de saúde.

 

A escala preocupante de mortes ocorre num momento em a epidemia está se acelerando no país, dentro do contexto que se apelidou de "segunda onda". A média móvel semanal de mortes por dia ocorrida em função da pandemia está em 639, ou seja, 25% maior do que era duas semanas atrás.

 

As últimas 10 mil mortes no país foram registradas em 17 dias, um período menor que as 10 mil mortes anteriores, ocorridas ao longo de 23 dias. Essa aceleração se reflete na lotação dos hospitais. Em sete capitais brasileira, a ocupação de leitos de UTI já está acima de 90%.

 

O número de casos também cresceu (mais 27% no mesmo período), evidenciando a preocupação. O número de casos diagnosticados de Covid-19 no país até agora é de 6.836.313, uma marca que se acredita ser mais subestimada que a de mortes, já que óbitos são menos propensos à subnotificação do que casos não letais.

 

O aumento de casos vai contra a tendência comunicada em declarações do presidente Jair Bolsonaro, para quem a epidemia estaria "no finalzinho".

 

Em livro que lançou após ser demitido do cargo de ministro, Mandetta conta de onde surgiram as três projeções dos casos.

 

"Um dos cenários, elaborado pelo médico Júlio Croda, diretor do Departamento de Imunizações e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, previa 180 mil mortes caso o país não adotasse as medidas necessárias de distanciamento social e padrões rígidos de higiene e proteção", escreveu.

 

"Tínhamos também o cenário do Wanderson [Oliveira], que trabalhava com a hipótese de haver entre 60 mil e 80 mil óbitos no Brasil durante a pandemia, e que levava em conta que o governo ia trabalhar direito: preparar, isolar bem, proteger os idosos, aumentar o número de UTIs e de leitos, conseguir abastecer a rede toda."

 

Um terceiro cenário, desenhado pelo ex-secretário-executivo do ministério João Gabardo, projetava 30 mil mortes, e foi descartado como considerado "otimista demais".

 

Se levados à risca, os números do modelo inicial significariam que o poder público perdeu a oportunidade de salvar 100 mil a 120 pessoas.

 

A conta da culpa que o governo federal tem pelas mortes não é tão simples de fazer, afirmam, epidemiologistas não ligados ao Ministério da Saúde, mas a falha em implementar pontos esseciais da política contra a pandemia resultou sim em um número mais acentuado de óbitos. Essa é a opinião da epidemiologista Gulnar Azevedo, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).

Provavelmente a gente teve muito mais óbito do que seria esperado se as medidas tivessem sido tomadas no momento certo, com planejamento de assistência, com uma estratégia de comunicação, mas dizer com precisão o quanto foi é complicado, porque as nossas projeções são baseadas em dados de muita incerteza — afirma a médica.

 

— Eu não afirmo quantas mortes a gente poderia evitar, mas com certeza poderíamos ter evitado muito, talvez a metade, se a gente tivesse seguido desde cedo as medidas de saúde pública, se tivesse coordenação com rapidez de fluxo para atendimento — completa.

 

O quinhão de culpa do poder público na pandemia também foi alvo de uma carta aberta da Associação Nacional de Medicina (ANM) divulgada nesta sexta-feira (11), que já dá como certo que o Brasil chegará a 200 mil mortos por Covid-19.

 

"O negacionismo irresponsável de muitos gestores e políticos precisa cessar já. Grande parte das 200 mil mortes que logo contabilizaremos poderia ter sido evitada. O tempo perdido com a falsidade, matou dezenas de milhares e vai seguir matando!", afirma o documento.

 

Segundo o presidente da entidade, Rubens Belfort Jr., uma atitude de "negacionismo" da gravidade da pandemia por parte do governo federal e seus aliados em outras esferas, abriu caminho para o agravamento da panemia.

 

— Existe um profundo distanciamento entre a sociedade científica e todas as evidências científicas e as políticas governamentais. Nunca tivemos um governo que fosse tão hostil às evidências científicas como temos agora. E o desprezo enorme pelas dezenas de milhares de pessoas que vão morrer desnecessariamente — disse o médico ao GLOBO.

 

Para especialistas, com o início da vacinação ainda incerto e uma previsão imprecisa de quando o país terá uma parcela razoável da população imunizada, é importante o país voltar agora a repensar as medidas de intervenção não farmacêutica e retrair as políticas de abertura da economia em muitas regiões.

 

Fonte: G-1

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